quinta-feira, 30 de maio de 2019

Condôminos inadimplentes podem usar as áreas comuns

"Condôminos inadimplentes podem usar as áreas comuns"

São Paulo, 30 de Maio de 2.019.

Sobre isso eu já havia escrito em 10 de Janeiro de 2019, mas volto agora ao tema por conta de recente decisão do Superior Tribunal de Justiça - STJ, que praticamente pacifica o assunto.

Aqui, portanto, serei breve, tratando apenas dessa nova decisão, que entende que condôminos inadimplentes não podem ser proibidos de usar as áreas comuns.

Quem quiser ler o texto anterior basta clicar nesse link, pois trato inclusive de questões relacionadas a condomínios que possuem essa vedação na própria Convenção ou no Regimento Interno, ou mesmo por decisões de assembleias, sendo qualquer proibição que constar nesses documentos deve à partir de agora ser considerada inválida, sob pena, inclusive, de gerar até condenação por danos morais.

O caso recente envolveu o Condomínio Tortuga's, no Guarujá, Recurso Especial n.º 1699022/SP (2017/0186823), cuja notícia publicada no próprio site do STJ reproduzo abaixo na íntegra (publicada em 28/05/2019, às 19h24):

"O morador que esteja com as mensalidades do condomínio em atraso não pode ser impedido de usar as áreas comuns do prédio, como piscina, brinquedoteca, salão de festas ou elevadores.

O entendimento foi adotado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao dar provimento ao recurso de uma proprietária de apartamento que estava impedida de usar as áreas comuns do condomínio por causa do não pagamento das cotas condominiais.

Por unanimidade, o colegiado considerou inválida a regra do regulamento interno que impedia o uso das áreas comuns em razão de inadimplência das taxas.

No caso discutido no recurso, a dívida acumulada era de R$ 290 mil em 2012, quando a condômina entrou com ação para poder utilizar as áreas comuns após ter sido proibida pelo condomínio.

Ela alegou que a inadimplência ocorreu devido a uma situação trágica, pois ficou impossibilitada de arcar com as despesas depois que seu marido foi vítima de latrocínio. Além disso, afirmou que já há duas ações de cobrança em andamento, nas quais foram penhorados imóveis em valor superior à dívida.

O pedido foi julgado improcedente em primeira instância – decisão mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que entendeu que a utilização de serviços não essenciais sem contraprestação seria um incentivo à inadimplência.

Controvérsia

Em 2016, a Terceira Turma do STJ, ao julgar um caso semelhante, decidiu no mesmo sentido, declarando a impossibilidade de regras regimentais restringirem o acesso às áreas comuns em caso de não pagamento de taxas condominiais.

O relator do recurso especial analisado pela Quarta Turma, ministro Luis Felipe Salomão, destacou o ineditismo da questão no colegiado, lembrando que a doutrina tem posições divergentes quanto à possibilidade de restrição do uso de áreas comuns em caso de inadimplência.

Salomão disse que o Código Civil estabeleceu como característica a mescla da propriedade individual com a copropriedade sobre as partes comuns, perfazendo uma unidade orgânica e indissolúvel.

O ministro destacou a regra do inciso II do artigo 1.335 do Código Civil – clara, segundo ele, na garantia do uso das áreas comuns como um direito do condômino.

“Além do direito a usufruir e gozar de sua unidade autônoma, têm os condôminos o direito de usar e gozar das partes comuns, desde que não venham a embaraçar nem excluir a utilização dos demais”, afirmou o relator.

Segundo o ministro, o condomínio não pode impor sanções que não estejam previstas em lei para constranger o devedor ao pagamento do débito. Ele disse que “não há dúvidas de que a inadimplência dos recorrentes vem gerando prejuízos ao condomínio”, mas que o próprio Código Civil estabeleceu meios legais “específicos e rígidos” para a cobrança de dívidas, “sem qualquer forma de constrangimento à dignidade do condômino e demais moradores”.

Sem previsão legal

O relator concordou com um dos argumentos da recorrente, de que o parágrafo 1º do artigo 1.336 do CC/2002 é claro quanto às penalidades a que está sujeito o condômino inadimplente, e entre elas não está a proibição de utilização das áreas comuns.

Salomão disse que o Código Civil, ao dispor sobre direitos dos condôminos, quando quis restringir ou condicionar algum desses direitos em razão da falta de pagamento o fez de forma expressa.

“E como é sabido, por uma questão de hermenêutica jurídica: as normas que restringem direitos devem ser interpretadas restritivamente, não comportando exegese ampliativa.”

O ministro ressaltou que a falta de pagamento das taxas condominiais vem sendo desestimulada em razão da possibilidade de perda do imóvel, por ser exceção expressa à impenhorabilidade do bem de família."

--- x ---

Terminado o texto do próprio site do STJ, faço apenas um último comentário que já me foi formulado na outra ocasião por um trabalhador de uma administradora de condomínio, mas que não constou dessa recente decisão:

"- Mas e aqueles condomínios que possuem serviços do tipo 'pay per use'? Como se deve comportar o síndico nos casos dos inadimplentes?"

A única forma de não causar diferenciação entre adimplentes e inadimplentes é cobrar antecipadamente pelos serviços que serão usados. Quem não pagar, não usa. Porque evidentemente que o inadimplente que for cobrado posteriormente, no próprio boleto, permanecerá inadimplente com mais essa despesa.

E cobrando antecipadamente de todos, ninguém terá o seu direito de uso de determinado serviço prejudicado.

Joel dos Santos Leitão
OAB/SP nº. 173.186


É advogado atuando majoritariamente na esfera condominial. Especialista em direito tributário na PUC/SP / Cogeae. Foi Ouvidor da AASP - Associação dos Advogados de São Paulo e foi Relator da 20ª Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP. Bacharel em Filosofia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O condomínio é obrigado a reservar vagas para pessoas com necessidades especiais?

  Sorteio de Vagas de Garagem O condomínio é obrigado a reservar vagas para pessoas com necessidades especiais? Em caso afirmativo, quan...