domingo, 31 de março de 2019

Contratos de Condomínios com Empresas de Manutenção de Elevadores


"Contratos de condomínios com empresas de
manutenção de elevadores"

São Paulo, 31 de Março de 2.019.

Há determinadas obrigações que os síndicos são obrigados a manter, sob pena de ter que responder na esfera cível e criminal em caso de negligência. É o caso da manutenção periódica dos elevadores, sendo que em algumas situações a jurisprudência entende que a responsabilidade do condomínio pode ser solidária, mesmo havendo essa contratação, devendo o condomínio ter cuidado com a escolha da empresa que prestará o serviço e no acompanhamento do contrato.

Numa outra seara, esses contratos, por mais que alguns entendam que são abusivos, por impor multas exageradas em caso de rescisão, demandam o devido cuidado, pois nem sempre os julgados dos tribunais entendem que a multa é abusiva, obrigando os condomínios que rescindem o contrato sem motivação a indenizar, nos termos do contrato - muitas vezes com multa de 50% (cinquenta por cento) sobre as parcelas ainda não pagas.

Também não se pode perder de vista que se o elevador não é mais fabricado a empresa é obrigada a fornecer peças originais somente durante determinado período, tudo em consonância com o Código de Defesa do Consumidor. Mas passando esse período, a obrigação do fornecedor cessa. São essas as questões que passarei a discorrer logo abaixo.

Da Responsabilidade solidária do condomínio

Ao condomínio não basta a contratação de uma empresa idônea para que faça a manutenção de seus elevadores. É importante que o condomínio acompanhe o contrato, a prestação de serviços, bem como notifique a empresa de forma constante quando detectar alguma irregularidade. Vale dizer, o condomínio tem que formalizar todas as situações que demonstrem problemas com os elevadores, motivo pelo qual a figura do zelador é primordial para relatar ocorrências que fogem da normalidade.

Veja o julgado abaixo:

"INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – Queda de elevador – Danos morais e materiais causados à autora – Nexo causal presente – Responsabilidade civil do condomínio e da empresa de elevadores que se reconhece – Dever de indenizar que se impõe aos requeridos – Danos materiais bem demonstrados pelos documentos juntados à petição inicial e que devem ser ressarcidos no valor fixado na sentença (R$ 401,40) – Danos morais que, diante do sofrimento físico e emocional impingido à autora, devem ter a indenização fixada na sentença (R$ 10.000,00) majorada para R$ 25.000,00 (...) - Recurso da autora e da empresa de elevadores parcialmente providos e recurso do condomínio e da seguradora desprovidos." (TJSP; Apelação 0168000-08.2010.8.26.0100, Relator Miguel Brandi, Órgão Julgador 7ª Câmara de Direito Privado, Julgado em 31/03/2017) - sem grifos no original.

Ao julgar o caso o Desembargador Miguel Brandi explicou no teor do Acórdão que o elevador caiu de forma abrupta do 10º andar ao subsolo, relatando também que:

"O Condomínio, por sua vez, notadamente atuou com negligência na escolha da empresa contratada para a execução do referido serviço e na fiscalização de sua execução.
Importa, ressaltar, neste tocante, que a displicência parecia ser a tônica da conduta dos responsáveis pela administração do Condomínio requerido, à época dos fatos. O novo gerente do Condomínio, Luiz Marcel Main, atuante quando chamado a depor no Inquérito Policial nº 1090/2009, declarou ter encontrado uma série de irregularidades de gestão, ao iniciar seus trabalhos, a exemplo de funcionário que exercia a função de bombeiro, sem treinamento para tanto (fls. 504), trazendo esse contexto explicação sobre a falta de registro do acidente nos assentos do requerido (fls. 504).
Patente, portanto, o dever do Condomínio e da empresa Elevadores Atlas Schindler de indenizar a autora pelos danos morais e materiais experimentados.
O dano moral é demonstrado pelo sofrimento físico e psicológico que lhe foi impingido pelas sequelas decorrentes do acidente sofrido com a queda do elevador.
No caso, o Laudo de Lesão Corporal nº 68398/2009, consigna que as lesões sofridas pela autora são de natureza grave (fls. 459). Ainda, os relatórios do médico, que a acompanhou, consignam a fratura sofrida no primeiro dedo do pé esquerdo, na data do acidente, e que, tentado inicialmente um tratamento conservador, com imobilização do membro, este não apresentou resultado, em razão da sequela da poliomelite que o atinge e pela marcha da autora ter apoio nessa região."

Outra decisão:

"RESPONSABILIDADE CIVIL. Acidente sofrido pelo autor em decorrência de queda de elevador. Ocorrência de fraturas no joelho e na perna esquerda. Responsabilidade objetiva do condomínio pelo fato da coisa, com fundamento no direito comum. Responsabilidade objetiva da fornecedora de serviços de manutenção do elevador, por fato do serviço, com fundamento no CDC. Ação procedente, para condenar solidariamente as rés ao pagamento de indenização por danos morais e danos materiais, a serem apurados em liquidação. Procedentes as lides de regresso contra as seguradoras, nos limites das apólices. Recurso do autor provido, para majoração dos danos morais para o valor de R$ 35.000,00. Recursos das rés improvidos." (TJSP; Apelação 0032200-51.2009.8.26.000, Relator Francisco Loureiro, Órgão Julgador 6ª Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/03/2012) - sem grifos no original.

E ainda:
"RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE SOFRIDO PELA AUTORA NAS DEPENDÊNCIAS CONDOMINIAIS. QUEDA EM RAZÃO DE DESNÍVEL DO ELEVADOR EM RELAÇÃO AO SOLO. AUSÊNCIA DE BORRACHA DE PROTEÇÃO NAS LATERAIS DO ELEVADOR. PROVAS DOCUMENTAIS E PERICIAS CONCLUSIVAS. CONDUTA DESIDIOSA QUE OCASIONOU GRAVE LESÃO NOS DEDOS DA MÃO DIREITA DA AUTORA. CULPA CONCORRENTE NÃO EVIDENCIADA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO CONDOMÍNIO E DA EMPRESA DE MANUTENÇÃO DO ELEVADOR. VÍTIMA SUBMETIDA A TRATAMENTOS MÉDICOS E CIRÚRGICOS. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR ARBITRADO EM OBSERFVÂNCIA À DÚPLICE FINALIDADE, PUNITIVA E COMPENSATÓRIA, DA REPARAÇÃO. DANO MATERIAL COMPROVADO. DISPÊNDIO DE VALORES PARA AQUISIÇÃO DE MEDICAMENTOS. LUCROS CESSANTES (ART. 402 DO CC). INDENIZAÇÃO DEVIDA. INCONFORMISMO DOS RÉUS QUANTO AO VALOR FIXADO. INADMISSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA SEGURADORA LITISDENUNCIADA MANTIDA. PRECEDENTE DO C. STJ EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO. CONDENAÇÃO DA SEGURADORA EM VERBAS SUCUMBENCIAIS DA LIDE SECUNDÁRIA INCABÍVEL. AUSÊNCIA DE RESISTÊNCIA. RECURSOS DO CONDOMÍNIO RÉU E DA EMPRESA RÉ NÃO PROVIDOS. RECURSO DA SEGURADORA LITISDENUNCIADA PROVIDO EM PARTE. (TJSP; Apelação 0033273-14.2010.8.26.0068, Relator Alfredo Attié, Órgão Julgador 26ª Câmara de Direito Privado, Julgado em 01/10/2018)

Nesse caso acima o Desembargador Alfredo Attié ainda asseverou que de nada adianta no caso concreto aquela plaquinha afixada ao lado dos elevadores, com os dizeres "Antes de entrar no elevador, verifique se o mesmo encontra-se parado neste andar", pois o desnível do elevador para com o solo retira a possível culpa concorrente da vítima, ou seja, a pessoa que sofreu o acidente não foi desatenta ou não agiu com imprudência, sendo que tanto o condomínio como a empresa de elevador deveriam manter a máquina nivelada com o solo.

Portanto, a conduta do condomínio não pode ser de apenas firmar um contrato com a empresa de manutenção de elevadores sem acompanhar a respectiva efetividade da prestação dos serviços, sem o qual poderá também ser responsabilizado de forma solidária, sem contar a possibilidade do síndico ter que responder na esfera criminal por conta de eventuais lesões corporais ou morte. (Vide também Apelação n.º 0001709-45.2009.8.26.0361 e 1013412-87.2014.8.26.0002).

Da Rescisão sem motivação

Situação que já presenciei em alguns condomínios é a daquele síndico que acabou de chegar e resolve dar uma de 'gestor', que segundo ele implica em diminuir todas as despesas, mandar funcionários embora, contratar empresas terceirizadas, rescindir contratos cujo valor ele considera abusivos, enfim, tudo, evidentemente, sem consultar um advogado, sem observar as cláusulas dos contratos de prestação de serviços existentes e sem qualquer planejamento.

Nesses casos, por mais que se apliquem as regras do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, diversos julgados aplicam também o Código Civil, mantendo a penalidade de 50% prevista no contrato:

"Ação de declaratória de rescisão contratual c.c. inexigibilidade de débito – Contrato de prestação de serviços de manutenção preventiva e corretiva de elevadores. Nulidade da r. sentença – Inocorrência – Sentença fundamentada, preenchendo os requisitos do art. 489, do CPC – Preliminar repelida. Ação declaratória de rescisão contratual c.c. inexigibilidade de débito – Contrato de prestação de serviços de manutenção preventiva e corretiva de elevadores – Pretensão ao afastamento de multa compensatória, alegando-se que a rescisão contratual estaria motivada na falha da prestação de serviços do réu – Descabimento – Não se desincumbiu o autor do ônus de comprovar a existência na prestação de serviços do requerido, nos termos do art. 373, I, do CPC – Diante da ausência de justa causa a motivar a rescisão contratual, devida a multa compensatória prevista no contrato – Fixação no percentual de 50% das prestações vincendas – Valor que se mostra alinhado ao art. 603 do Código Civil – Abusividade não evidenciada – Débito exigível – Sentença reformada – Recurso provido. Recurso provido." (TJSP, Apelação 1071985-76.2018.8.26.0100, Relator Francisco Giaquinto, Órgão Julgador 13ª Câmara de Direito Privado, Data do Julgamento 20/03/2019)

"Prestação de serviço. Contratação de serviço de portaria e limpeza de condomínio por 24 meses. Rescisão unilateral. Ausência de justa causa. Condomínio que, na notificação extrajudicial endereçada à prestadora de serviço, elencou motivos para a resilição unilateral. Ausência de comprovação de que a autora não estaria prestando os serviços a contento. Evidenciado nos autos que a rescisão unilateral foi sem justa causa. Incidência do art. 603/CC. Reforma da sentença. Apelo provido." (TJSP; Apelação 1016100-04.2014.8.26.0008; Relator (a): Ramon Mateo Júnior; Órgão Julgador: 12ª Câmara Extraordinária de Direito Privado; Foro Regional VIII - Tatuapé - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 10/06/2016; Data de Registro: 13/06/2016)

E isso se dá porque o Código Civil determina que:

"Art. 603. Se o prestador de serviço for despedido sem justa causa, a outra parte será obrigada a pagar-lhe por inteiro a retribuição vencida, e por metade a que lhe tocaria de então ao termo legal do contrato."

Mas em alguns casos o condomínio consegue ao menos reduzir o valor da multa estipulada no contrato:

"APELAÇÃO - AÇÃO DE COBRANÇA - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - CONTRATO DE MANUTENÇÃO DE ELEVADORES - RESCISÃO UNILATERAL - MULTA PREVISTA EM CONTRATO DE 50% DAS MENSALIDADES RESTANTES PARA O TÉRMINO DO PRAZO CONTRATUAL - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - RECURSO - MULTA CONTRATUAL - DEVIDA - PERCENTUAL QUE SE MOSTRA ELEVADO E DEVE SER REDUZIDO PARA 10% DOS VALORES DAS MENSALIDADES RESTANTES PARA O TÉRMINO DO PRAZO CONTRATUAL - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO." (TJSP; Apelação 1000307-83.2018.8.26.0008, Relator Carlos Abrão, Órgão Julgador 14ª Câmara de Direito Privado, Julgamento 20/03/2019)

Mas há situações também em que os julgados entendem que a multa é definitivamente abusiva, por afrontar as normas da Lei n.º 8.078/90 - Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Embora eu seja partidário desse entendimento, achei por bem colacionar os julgados acima, pois nem sempre os Desembargadores optam por considerar a multa abusiva, como ficou demonstrado. A seguir veja entendimentos no sentido da abusividade da multa contratual de 50%:

"CONTRATO – Prestação de serviços – Rescisão de contrato de locação de serviços para elevadores – A multa de 50% das mensalidades restantes é excessivamente onerosa – Imposição de valor abusivo e da manutenção do liame obrigacional – Renovação anual do contrato automática - Impraticabilidade da desistência contratual – Incidência do art. 51, inciso IV e §1º, inciso III do CDC – Nulidade reconhecida – Inexigibilidade do débito – Sentença mantida – Recurso improvido." (TJSP; Apelação n.º 1003081-86.2018.8.26.0008, Relator J. B. Franco de Godoi, Órgão Julgador 23ª Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/11/2018)

“CONTRATO - Prestação de serviços - Manutenção de elevadores - Estipulação ambígua acerca do prazo de vigência da avença no caso de renovação, bem como sobre a hipótese de incidência de multa - Interpretação mais favorável à parte aderente - Multa descabida - Pedidos declaratório de inexistência de débito procedente - Recurso desprovido, no particular.” (Apel. Nº 0035089-38.2009.8.26.0562 14ª C. Direito Privado Des. Rel. Melo Colombi j. 01.08.2010)

Nesses casos, mesmos se aplicando o Código de Proteção e Defesa do Consumidor - CDC, utiliza-se também a norma do artigo 413, do próprio Código Civil, diminuindo-se o valor da multa:

"Art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio."

Seguem-se decisões nesse sentido:

"PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – CONTRATO DE MANUTENÇÃO DE ELEVADORES – RESCISÃO UNILATERAL – MULTA PREVISTA EM CONTRATO DE 50% DAS MENSALIDADES RESTANTES PARA O TÉRMINO DO PRAZO CONTRATUAL – ABUSIVIDADE RECONHECIDA – MULTA REDUZIDA PARA 10% - APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 413 DO CÓDIGO CIVIL. – Recurso provido." (TJSP; Apelação 1012612-17.2018.8.26.0100, Relator Edgard Rosa, Órgão Julgador 25ª Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/10/2018).

"INDENIZAÇÃO Rescisão do contrato de manutenção de elevadores Previsão contratual de Multa compensatória Hipótese em que a multa se mostra legitima e deve ser arcada pela parte que deu ensejo a rescisão do contrato Percentual da multa que se mostra elevado e deve ser reduzido para 10% dos valores das mensalidades restantes para o término do prazo contratual - Sentença reformada no ponto - Recurso parcialmente provido" (TJSP; Apelação 1009407-83.2017.8.26.0562; Relator (a): Heraldo de Oliveira; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santos - 8ª Vara Cível; Data do Julgamento: 09/04/2018; Data de Registro: 09/04/2018)

Dessa forma, a rescisão imotivada sempre gerará uma situação de risco, ficando o condomínio à mercê da Câmara Julgadora que analisará o caso concreto, motivo pelo qual minha sugestão é que o síndico sempre tente adotar uma postura conservadora diante da situação, observando o contrato.

Da Rescisão motivada

E quando se consegue provar que a rescisão foi motivada, ou seja, a empresa de manutenção de elevadores deixou de atender o condomínio de forma adequada, mesmo após ser devidamente notificada, a jurisprudência entende devida a rescisão e libera o condomínio do pagamento de qualquer tipo de penalidade:

"Ação declaratória c.c. indenização julgada parcialmente procedente - Serviços de manutenção preventiva e corretiva de elevadores - Atendimento inadequado às solicitações do condomínio - Má prestação de serviços que levou a rescisão contratual - Reconhecida a inexigibilidade da multa rescisória - Danos materiais - Apresentação de orçamento elaborado por empresa que substituiu a ré - Inexistência de prova do prejuízo material e da responsabilidade da ré pelos novos serviços contratados - Art. 373, I, do CPC - Recurso improvido." (TJSP; Apelação 1008890-38.2018.8.26.0564, Relator Miguel Petroni Neto, Órgão Julgador 16ª Câmara de Direito Privado, Julgamento 12/02/2019)

Perceba-se que 'provar' significa que o condomínio tome medidas que formalizem sua indignação, para que consiga convencer o juiz de suas alegações. Não adiantam mensagens por WhatsApp que não notifiquem a empresa formalmente, tampouco telefonemas. Tudo isso deve ser realizado através de troca de e-mails, mas preferencialmente por Notificações Extrajudiciais em que se constitui em mora a empresa de manutenção de elevadores, concedendo-lhes um prazo razoável, preferencialmente os previstos no contrato, quando existem, para resolver os problemas constatados.

Da Renovação Automática do Contrato

Quando o condomínio deseja rescindir um contrato, não apenas de manutenção de elevadores, deve analisar com tranquilidade o que está estipulado em suas cláusulas, para que não seja penalizado, pois mesmo a cláusula de renovação automática do contrato é considerada válida por julgados do Tribunal de Justiça de São Paulo:

"DIREITO CIVIL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE MANUTENÇÃO DE ELEVADOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE MULTA CONTRATUAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. MATÉRIA PRELIMINAR PROCESSUAL DEDUZIDA NA RESPOSTA AO RECURSO QUE SE AFASTA. PRORROGAÇÃO AUTOMÁTICA DO CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO SE NÃO MANIFESTADA OPOSIÇÃO PELO TOMADOR DO SERVIÇO QUE NÃO CONFIGURA CLÁUSULA ABUSIVA. INVIABILIDADE DE REDUÇÃO DA "MULTA COMPENSATÓRIA" PORQUE DESPIDA DA NATUREZA DE PENALIDADE, CONFIGURANDO AUTÊNTICA INDENIZAÇÃO PREVISTA EM LEI PELA RUPTURA INJUSTIFICADA DO CONTRATO POR PARTE DO TOMADOR DO SERVIÇO. RECURSO DESPROVIDO." (TJSP; Apelação 1019226-43.2015.8.26.0003, 35ª Câmara de Direito Privado, Relator Gilberto Leme, Julgado em 17/12/2018.

Isso implica que o condomínio faça o devido acompanhamento e gestão de seus contratos para que, de forma estratégica, saiba o melhor momento de fazer novas cotações no mercado e saber quando poderá fazer as rescisões sem ter que arcar com multas que, muitas vezes, atrapalharão o fluxo de caixa normalmente já escasso do condomínio, não obstante julgados que, em vista do longo tempo do contrato, poderão dar ganho de causa ao condomínio em caso da rescisão antes do tempo, livrando-o de multa, como ficou demonstrado no tópico acima "Da Rescisão sem motivação".

Do prazo para fornecimento de peças originais

Situação com a qual me deparei recentemente envolve um condomínio cujo elevador não é mais fabricado há mais de dez anos e, por esse motivo a empresa fabricante, que ao mesmo tempo faz a manutenção, informou que não possui mais as peças originais. Nesse caso concreto determinadas peças somente são fornecidas sob encomenda e, ainda assim, de fabricação de empresa terceirizada.

A Lei n.º 8.078/90 (CDC), em seu artigo 21, determina que deverão ser fornecidas peças originais, mas o artigo 32, em seu parágrafo único, estipula que cessada a produção ou importação a oferta deverá ser mantida por período razoável de tempo, na forma da lei. Só que não há lei estipulando esse período razoável de tempo, sendo que o inciso XXI, do artigo 135, do Decreto n.º 2.181/1997, estabelece que período razoável de tempo nunca poderá ser inferior ao tempo de vida útil do produto ou serviço.

Em outras palavras: está instaurada a celeuma! E ela só pode ser dirimida pelo Poder Judiciário - sempre ele - que é acionado para resolver os conflitos em vista das omissões e/ou confusões legislativas. Em situações como essa, vem se entendendo que o período de 10 (dez) anos para que a empresa fornecedora continue a fabricar as peças seria um período razoável de tempo, especialmente quando previsto no contrato:

"PRELIMINAR - Cerceamento de defesa - Não ocorrência - Inútil a pretensão do autor de demonstrar qual o problema apresentado no elevador e quais peças teriam sido trocadas, posto que a requerida, detentora de expertise na área em que atua e responsável pela manutenção do equipamento, informou a causa da paralisação do elevador e apresentou orçamento com descrição de serviços e peças necessários - Julgamento da lide que independe de dilação probatória - Preliminar rejeitada.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - Prestação de serviços - Pretensão do autor de ver a ré compelida a realizar conserto em seu elevador, arcando com todos os custos daí decorrentes - Pactuação que se deu de forma livre, não havendo sequer alegação de que tenha havido vício social ou de consentimento - Contrato de adesão, com cláusulas preestabelecidas, que não invalida a avença - Elevador instalado em 29/09/1999 - Equipamento que parou de funcionar em 28/10/2014 por causa do desgaste natural de peças - Cláusula contratual de garantia de fabricação das peças por até 10 anos, que exclui a responsabilidade da requerida em arcar com o custeio de peças com mais de 15 anos de uso - Respeitado o tempo razoável de fornecimento de peças, nos termos do art. 32 do CDC - Desgaste natural do equipamento que não caracteriza falha em sua manutenção - Não evidenciada a alegada má prestação de serviços, que se deu ao longo de quase quinze anos, quinzenalmente - Sentença de improcedência mantida - Recurso desprovido. (TJSP; Apelação 1018763-04.2015.8.26.0003 - Relator Mendes Pereira, Órgão Julgador 15ª Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/12/2016) - sem grifos no original.

Portanto, transcorridos os 10 (dez) anos de término da comercialização do elevador fornecido ao condomínio e havendo notificação da empresa fabricante de que não fabrica mais aludidas peças ou parte delas, especialmente se também houver previsão contratual, há de se estudar a realização da modernização dos elevadores ou de parte de suas peças, visando minimizar as chances de sinistros que possam acarretar indenização ao próprio condomínio por sua omissão, como os diversos julgados acima demonstraram a possibilidade de ocorrer.

Joel dos Santos Leitão
OAB/SP nº. 173.186

É advogado atuando majoritariamente na esfera condominial. Especialista em direito tributário na PUC/SP / Cogeae. Foi Ouvidor da AASP - Associação dos Advogados de São Paulo e foi Relator da 20ª Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP. Bacharel em Filosofia.

quarta-feira, 20 de março de 2019

Assembleia de Condomínio pode ser anulada se votar o que não constou no Edital de Convocação


"Assembleia de Condomínio pode ser anulada se votar o que não constou no Edital de Convocação"

São Paulo, 19 de Março de 2.019.

Há condomínios que insistem em desrespeitar as formalidades previstas em lei e na sua própria Convenção de Condomínio quando da realização da assembleia, votando assuntos que não constavam na pauta do Edital de Convocação, vale dizer, da 'ordem do dia', e isso pode gerar a nulidade, se não da totalidade da assembleia, ao menos dos assuntos irregularmente votados.

Sempre que vou participar  de assembleias de condomínio, e isso acontece toda semana, às vezes dias seguidos, procuro pedir para analisar o Edital de Convocação antes que seja distribuído aos moradores, e sempre faço alterações, porque nem sempre há correspondência sobre o que se pretende votar e o que consta do respectivo edital.

O item do Edital de Convocação que gera mais polêmica é sempre o "Assuntos Gerais de Interesse do Condomínio", que normalmente fica por último na pauta, pois como se percebe ele é extremamente genérico, diz muito e ao mesmo tempo não diz nada. Nesse tópico os moradores podem discutir questões cotidianas ou mesmo mais profundas, mas nunca votar e deliberar sobre algo que não constou expressamente no Edital de Convocação.

E isso se dá porque a transparência e a clareza são inerentes ao Edital de Convocação. Isso permite que os condôminos tenham ciência do que será discutido, sem surpresas.

Um morador pode não ter o mínimo interesse em participar de uma assembleia convocada, cujo item da pauta é "Deliberação e votação para utilização do salão de festas para comemoração do Halloween", pois pode ser que ele não utilize o salão de festas, tampouco comemore o dia das bruxas.

Por isso quando esse assunto for discutido numa assembleia espera-se que respeite o calendário de reserva do salão de festas, utilizando-se dias não reservados, além de limitar-se aos enfeites, música, fantasias e coisas do tipo.

Num item de pauta como esse não se espera que seja votada a isenção da cota condominial para a unidade que cederá as fantasias, por exemplo. Primeiro porque a festa é específica dos interessados e a isenção da cota condominial afetará toda a comunidade dos moradores, inclusive a previsão orçamentária, extrapolando o que constou do Edital de Convocação. Segundo porque não constou do Edital de Convocação "Deliberação e votação para isenção de cota condominial no mês de outubro para a unidade que fornecerá as fantasias", o que permitiria que interessados em tratar essa questão comparecessem à assembleia, sendo, portanto, passível de nulidade e de se ter que devolver os valores ao condomínio.

Num caso interessante, que foi analisado pelo Poder Judiciário, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim deliberou sobre uma Assembleia de Condomínio que tratou de assuntos não previstos no Edital de Convocação:

"Agravo de instrumento. Condomínio. Tutela cautelar antecedente. Condomínio misto (residencial e comercial) com sistema “pool” de locações. Assembleia Geral Extraordinária que deliberou pela interdição do Hotel situado no edifício, considerando a falta de manutenções necessárias, renovação do AVCB e débitos. Convocação da assembleia que, no entanto, não especificou na “ordem do dia” os assuntos a serem nela deliberados. Elementos nos autos que evidenciam a probabilidade do direito das autoras. Liminar concedida para suspender os efeitos da deliberação assemblear de interdição do hotel. Agravo provido. in Agravo de Instrumento n.º 2252714-89.2018.8.26.0000, voto n.º 20.187, da 35ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Morais Pucci, julgado em 29/01/2019.

Em seu voto o nobre relator ensinou que:

"A ata da Assembleia Geral Extraordinária realizada no dia 13/06/2018 revela que a assembleia foi convocada para deliberarem sobre os seguintes assuntos: “1) Apresentação da administradora Omissis; 2) Aprovação e Deliberação sobre os próximos passos administrativos; 3) Assuntos gerais de interesse do Condomínio”.

A ata da AGE do dia 13/06/2018, no entanto, revela que o foco da convocação era, no entanto, aprovar a interdição do “hotel”, isso em razão de falta de manutenções obrigatórias, renovação de seguro e auto de vistoria do corpo de bombeiros AVCB, além da existência de débitos imputados.

Observa-se, portanto, que a convocação não especificou suficientemente os temas a serem deliberados, trazendo apenas termos genéricos, situação que por si só invalida as deliberações não mencionadas na convocação, nos termos do art. 31 da convenção do condomínio: “as reuniões ordinárias e extraordinárias dos condôminos serão realizadas mediante convocação por circular assinada pelo síndico e colocadas em local visível por todos e enviada por carta registrada ou protocolada, a cada condômino, e com antecedência mínima de 8 (oito) dias da data fixada para a sua realização e só tratará de assuntos mencionados no edital de convocação, o qual também indicará o dia, hora e o local da reunião”.

E os juristas seguem esse entendimento, como é o caso de J. Nascimento Franco, que é lembrado na decisão acima:

“Para a validade da convocação é essencial que dela conste “ordem do dia” especificando os assuntos a serem submetidos à deliberação” (...) “ordem do dia deve ser enunciada de forma clara para propiciar aos condôminos prévio conhecimento da matéria a ser discutida, a fim de que eles possam optar por não comparecer, se a matéria lhe parecer irrelevante, ou se preparar para discuti-la e votá-la com pleno conhecimento de causa”. (...) “Expressões como 'assuntos gerais de interesse do condomínio' não podem ensejar deliberação sobre questões de maior relevância, como a que gera obrigações para o condomínio, altera a destinação das áreas e coisas de uso comum, modifica cláusulas da convenção, ainda que os comparecentes formem número suficiente para votá-las.” (in “Condomínio”, RT, 5ª ed., 2005, p. 99-102).

Recente situação trazida por um amigo ilustra situação semelhante. O condomínio com poucas unidades em que ele mora continha em um dos itens do Edital de Convocação a "Eleição para o cargo de síndico", motivo pelo qual ele sequer se deu ao trabalho de comparecer à assembleia, preferindo continuar seu trabalho até tarde da noite, pedindo que sua esposa comparecesse. Quando sua esposa lhe contou o que foi deliberado nesse item ele quase teve um infarto.

A assembleia, cujo objetivo era "Eleição para o cargo de síndico" teria eleito a síndica, mas não apenas isso. Também votou (1) a isenção da cota condominial para a síndica; (2) a remuneração da síndica; (3) a acumulação do cargo de síndica com o de zeladora, ou seja, a síndica passaria a ser funcionária do condomínio na qualidade de zeladora, sendo chefe dela mesma...

Particularmente acredito ser razoável que na mesma assembleia em que se escolherá o síndico se delibere sobre a isenção da cota condominial ordinária e a respectiva remuneração do síndico, pois são assuntos que possuem correlação, embora o mais correto e o que minimiza as chances de nulidade desse item na esfera judicial seja mesmo constar expressamente tais questões no Edital de Convocação, com a respectiva clareza, especialmente num condomínio pequeno, com poucas unidades, onde qualquer isenção de cota condominial acompanhada de remuneração da síndica influenciarão diretamente na previsão orçamentária, podendo trazer problemas às contas do condomínio e obrigar a elevação da cota condominial dos demais moradores.

Mas a síndica querer ser chefe dela mesma, acumulando a função de zeladora, além de ser algo totalmente atípico, parecendo mesmo uma aberração que não se pode permitir em hipótese alguma, deveria constar expressamente do Edital de Convocação, e as administradoras de condomínio devem orientar os síndicos sobre essa necessidade, tentando, dentro do possível (pois sabemos que alguns síndicos são de difícil trato), orientar sobre as melhores práticas.

É por isso que quando for confeccionado o Edital de Convocação a administradora do condomínio deve tentar entender o que o síndico pretende levar à votação, conversando e extraindo dele as informações que poderão ser discutidas, até para que seus colaboradores possam se preparar adequadamente e não serem surpreendidos com assuntos que não fizeram parte da 'ordem do dia'.


Joel dos Santos Leitão
OAB/SP nº. 173.186

É advogado atuando majoritariamente na esfera condominial. Especialista em direito tributário na PUC/SP / Cogeae. Foi Ouvidor da AASP - Associação dos Advogados de São Paulo e foi Relator da 20ª Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP. Bacharel em Filosofia.

sexta-feira, 8 de março de 2019

A necessidade de aprovação de obras na assembleia de condomínio - exceto as urgentes


"A necessidade de aprovação de obras na assembleia de condomínio - exceto as urgentes"

São Paulo, 08 de Março de 2.019.

Apenas um tipo de obra não necessita de aprovação na assembleia de condomínio: são as obras urgentes.

Todavia, para que o termo 'urgentes' não pareça algo que saiu apenas da cabeça do síndico, sugiro sempre que ele se ampare de forma técnica e fundamentada, preferencialmente através de um (ou mais) laudo de engenheiro civil, para que o profissional ratifique a sua real necessidade.

Posteriormente deve o síndico levar o assunto para ratificação em assembleia, demonstrando que o caso era tão urgente que não era possível aguardar a realização de uma assembleia.

É importante ter uma visão próxima à da administração pública quando se lida com o dinheiro dos outros. Há de se portar de forma conservadora quando o assunto é a utilização do dinheiro de terceiros, utilizando-se também de princípios e práticas privadas de governança corporativa e compliance. Há condomínios que criam essas regras e obrigam o síndico a segui-las quando é eleito.

Por isso o ideal é sempre que possível solicitar no mínimo 03 (três) orçamentos antes de qualquer tipo de contratação, além de, obviamente, pedir a um advogado que além de analisar o contrato e inserir cláusulas que garanta ao condomínio um mínimo de equilíbrio nessa relação jurídica, também faça uma pesquisa sobre a empresa nos sites abertos de busca, especialmente do Poder Judiciário e da Administração Pública, inclusive dos sócios da empresa, para confirmar que a empresa é idônea, além de aprovar em assembleia a respectiva obra.

A seguir passo a tratar de cada uma das situações tratadas pelo Código Civil quando o assunto são as obras no condomínio.

Das Obras Voluptuárias

O Código Civil dispõe em seu artigo 1.341, inciso I, que:

"Art. 1.341 - A realização de obras no condomínio depende:
I - se voluptuárias, de voto de dois terços dos condôminos;"
"Art. 1.342. A realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas construções, nas partes comuns, suscetíveis de prejudicar a utilização, por qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns." - sem grifos no original.

E o que são obras voluptuárias? O próprio Código Civil traz a respectiva definição, explicando que:

"Art. 96 - As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias.
§1º. São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor."

Portanto, se o síndico resolve por conta própria fazer obras no condomínio sem aprovação da assembleia e sem observar o quórum legal especificado em lei, pode ter que arcar com as consequências de seu ato unilateral.

Não podemos esquecer que o síndico não é o dono do condomínio. É um mandatário que deve observar as regras legais que lhe impõem zelar pelo patrimônio do condomínio enquanto estiver no cargo. Qualquer ato que extrapole as permissões a ele concedidas pelas leis em vigor, pela convenção e pelas decisões das assembleias são passíveis de responsabilização, inclusive de ter que devolver ao condomínio o valor gasto indevidamente.

É o caso de determinado condomínio onde o síndico resolveu construir uma churrasqueira. Assim entendeu o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos da Apelação Cível n.º 1000662-49.2015.8.26.0477, da 35ª Câmara de Direito Privado, julgada em 28/05/2018, cujo Relator foi o Des. Morais Pucci:

"CONDOMÍNIO. Ação demolitória ajuizada pelo condômino. Construção de churrasqueira e respectiva cobertura no corredor do pavimento térreo. Alegação do condômino que a obra traz prejuízos à sua unidade autônoma localizada no 1º andar e não houve a aprovação de 2/3 dos condôminos para realização da obra. Sentença de procedência. Apelação do condomínio réu. Cerceamento de defesa não caracterizado. Perícia desnecessária, na hipótese. Obras em acréscimo a fim de aumentar a utilização da área comum que exigiriam aprovação de 2/3 dos condôminos. Ausência de quórum qualificado que justifica a procedência do pedido de demolição da obra. Recurso não provido." - sem grifos no original.

Constou desse r. acórdão que:

"A r. sentença proferida às f. 169/171, destes autos de ação demolitória movida pelo condômino, MILTON VERSOLATO, em relação ao CONDOMÍNIO EDIFÍCIO HENRY, julgou procedente o pedido para determinar ao requerido a demolição da churrasqueira e respectivo abrigo, sob pena de multa diária e responsabilização criminal do síndico que o representar, em caso de desobediência." - sem grifos no original

E ainda:

"(...) o legislador além de exigir a aprovação de 2/3 dos condôminos para a construção de obras em acréscimo na área comum, como é o caso da construção da churrasqueira, veda a realização de obras que possam prejudicar os condôminos na utilização de sua unidade autônoma."

Também é importante salientar que esses 2/3 (dois terços) exigidos por lei não se limita aos presentes na assembleia, mas ao universo de todos as unidades autônomas, ou seja, da totalidade das unidades, mesmo aquelas não presentes em assembleia de condomínio, como já tive a oportunidade de discorrer a respeito.

Segundo lição de Francisco Eduardo Loureiro, extraída do acórdão acima reproduzido, “a maioria qualificada a que alude a lei é para aprovação da obra e não o quórum para instalação da assembleia. Os dois terços se contam sobre o universo daqueles aptos a votar, não somente dos presentes, excluídos, portanto, os inadimplentes” (Código Civil Comentado/ Cezar Peluzo (coord) Barueri, SP: Manole, 2007. p. 1.210)

Portanto, como nenhuma norma em vigor contém uma lista taxativa sobre o que seria uma obra voluptuária, útil ou necessária, sugere-se que antes de tomar a iniciativa de fazer do condomínio um canteiro de obras o síndico sempre consulte um advogado para que lhe auxilie a entender o assunto de forma técnica, através de um parecer.

Das Obras Úteis

Na sequência do artigo 1.341 temos as obras úteis, definidas pelo §2º, do artigo 96, ambos do Código Civil:

"Art. 1.341 - A realização de obras no condomínio depende:
(...)
II - se úteis, do voto da maioria dos condôminos;"

E o que são obras úteis?

"Art. 96 - (...)
§2º - São úteis as que aumentem ou facilitam o uso do bem."

É o caso do síndico que acha importante fazer algumas mudanças no salão de festas, para facilitar o uso do bem, embora não haja nada de urgente nessas obras, ou seja, se elas não forem realizadas os moradores poderão continuar a utilizar o salão de festas sem qualquer prejuízo:

"O conceito de benfeitorias úteis é negativo: são as que não se enquadram na categoria de necessárias, mas aumentam objetivamente o valor do bem. São aquelas que se poderia ter prescindido, mas que aumentam o valor do imóvel (...). Para o Código Civil brasileiro são úteis as benfeitorias que aumentem ou facilitam o uso do bem." - Carlos Roberto Gonçalves, in Direito das Coisas, 9ª edição, Saraiva, 2014, pg. 214.

Confira o julgado abaixo:

"CONDOMÍNIO. AÇÃO ANULATÓRIA DE ASSEMBLEIA. PLAYGROUND. ÁREA DE ENTRETENIMENTO INFANTIL PREEXISTENTE. OBRAS DE MELHORIA. QUÓRUM. VOTAÇÃO PELA MAIORIA. 1. Não é benfeitoria voluptuária, mas útil, a obra de reestruturação e melhoria do playground de condomínio de grande porte e densidade de moradores, posto que prevista na constituição de condomínio a área de entretenimento infantil, sendo essencial não só a sua existência, como também o funcionamento satisfatório e seguro dos equipamentos que o guarnecem. 2. Tratando-se de benfeitoria que constitui melhoria útil é inexigível quórum especial, podendo a deliberação ser tomada pela maioria dos condôminos ou dos presentes, em segunda convocação (Código Civil, Art. 1.341, II, c.c Art. 1.353) Sentença reformada. Recurso provido para julgar a ação improcedente. (Apelação n.º 1000294-04.2015.8.26.0004, Órgão julgador 37ª Câmara Extraordinária de Direito Privado do E.TJSP, Relator Des. Felipe Ferreira, Dje 08/01/2018).     

Das Obras Necessárias

No próprio Art. 1.341 do Código Civil há disposição sobre as denominadas 'obras necessárias' (sem grifos no original):

"Art. 1.341. A realização de obras no condomínio depende:
(...)
§ 1o As obras ou reparações necessárias podem ser realizadas, independentemente de autorização, pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer condômino.
§ 2o Se as obras ou reparos necessários forem urgentes e importarem em despesas excessivas, determinada sua realização, o síndico ou o condômino que tomou a iniciativa delas dará ciência à assembleia, que deverá ser convocada imediatamente.
§ 3o Não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários, que importarem em despesas excessivas, somente poderão ser efetuadas após autorização da assembleia, especialmente convocada pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer dos condôminos."

E o artigo 96 do Código Civil define as obras necessárias:

"Art. 96. (...)
§ 3o São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore."

Foi por isso que logo no início desse texto sugeri que o síndico sempre tenha o amparo de um engenheiro civil, se possível mais que um, para garantir que a obra é urgente, pois o síndico não é necessariamente técnico e deve sempre se amparar em posição fundamentada para que amanhã não sofra as consequências de um ato unilateral.

O quórum para obras necessárias é o da maioria dos condôminos em assembleia e recomendo a leitura do início desse texto, onde delas tratei de forma mais esmiuçada.

Da Legislação em São Paulo

Quando se trata de tratamento das fissuras e pintura das fachadas de edifício cada condomínio deve verificar também a legislação municipal para saber se há alguma obrigatoriedade estipulada em lei ou código de obras específico. No município de São Paulo, por exemplo, está em vigor a Lei n.º 10.518/88 e o Decreto 33.008/1993 que exigem a manutenção a cada 05 (cinco) anos, sob pena de aplicação de multa.

Da Legislação em São Bernardo do Campo

Em São Bernardo do Campo o artigo 17 do Código de Posturas (Lei 4.974/2001) determina que "Os proprietários, possuidores ou ocupantes de edificações devem conservar, em perfeito estado de asseio, os quintais, pátios e fachadas destas". E os artigos 382 e seguintes, além do Anexo I, estipulam a possibilidade de aplicação de penalidades e multas, que segundo o Anexo seria de R$ 100,00 (cem reais) para a infração ao artigo 17 - valor que a municipalidade provavelmente deve ter alterado, mas que não se consegue localizar em local visível.

Assim, se a municipalidade entender que o condomínio não está em perfeito "estado de asseio", poderá ele sofrer multa conforme previsto também no artigo 154, do Decreto n.º 13.500/2001, que regulamentou o Código de Posturas.

Note, portanto, que há uma subjetividade no termo 'estado de asseio', também não havendo clareza sobre qual seria o valor atualizado de eventual multa. Na dúvida o que se sugere é que o condomínio realize assim que possível a reforma e/ou manutenção das fachadas, até porque isso evita infiltrações e danos ainda maiores, como ter que indenizar unidades que venham a ser prejudicadas pela falta de manutenção, ou seja, a manutenção das fachadas é interesse do próprio condomínio

Mas no caso de lavratura de algum auto de infração a qualquer condomínio, seja lá em qual município for, devem ser observadas as normas preconizadas na lei para casos que envolvem a administração pública. Portanto, o condomínio terá direito a se defender, observando-se o contraditório, legalidade, devido processo legal e ampla defesa, antes da imposição de alguma multa, para que possa se adequar em tempo razoável, observando-se as regras legais de cada municipalidade.

Há de se observar, todavia, que o §2º, do artigo 382, da Lei n.º 4.974/2001 de São Bernardo, permite a aplicação direta de multa quando a falta de regularização possibilita risco à saúde ou à segurança pública.

Alguns síndicos me questionam sobre a necessidade de realização de obras necessárias, como manutenção e pintura das fachadas, mas que quando são levadas para discussão e aprovação em assembleia não são aprovadas pelos moradores. Muitas vezes a questão está mais na dificuldade de comunicação do síndico ou da administradora em demonstrar a necessidade da obra.

Não basta apenas levar o assunto para discussão e apresentar os orçamentos, que normalmente são muito caros e assustam os moradores, pois isso implicará rateio extraordinário. É importante que o síndico demonstre o que já gastou com a não realização de determinadas obras (como infiltração e indenização a unidades, por exemplo), leve um engenheiro para demonstrar as irregularidades, pois o técnico terá mais conhecimento que o síndico, além de apresentar gráficos e dados com valores que consigam sensibilizar os moradores para a manutenção de seu próprio bem.

Joel dos Santos Leitão
OAB/SP nº. 173.186

É advogado atuando majoritariamente na esfera condominial. Especialista em direito tributário na PUC/SP / Cogeae. Foi Ouvidor da AASP - Associação dos Advogados de São Paulo e foi Relator da 20ª Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP. Bacharel em Filosofia.

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