São Paulo, 03 de Agosto de 2.018.
O representante de uma Administradora de Condomínio foi
quem me fez a pergunta epigrafada, da seguinte forma:
"Se eu pudesse sugerir um
tema para suas próximas matérias, seria a destituição do Síndico Profissional.
Matéria bem polêmica, pois o conselho do condomínio teria poderes de destituir?
Segue-se a Lei ou o contrato de prestação de serviços do síndico pode trazer um
disposto claro a respeito deste assunto?
Muitos nos questionam, mas não
há um entendimento do assunto."
Eu acrescentaria ainda uma outra pergunta:
O que vale para o síndico
condômino, vale também para o síndico profissional?
O Síndico Profissional
O cenário é normalmente o mesmo. Cansados, para dizer o
mínimo, das trapalhadas do síndico condômino - muitas vezes eleito apenas para
não pagar a sua própria cota condominial; ou mesmo de sua falta de
transparência e do abuso de poder na condução da gestão; sem contar a
contabilidade de "difícil entendimento" e sem lastro documental,
alguns moradores se juntam e começam a cogitar a contratação de um síndico
profissional.
O nome é bonito: "Síndico
Profissional"!
Mas será que na prática o síndico profissional é tão
profissional como as empresas em que muitos trabalhamos exigem que sejamos, usando
métodos de governança corporativa, compliance,
cuidados ambientais, gestão e respeito às pessoas, liderança, dentre outros
inerentes a cada profissão?
Infelizmente nem sempre isso acontece. Já lidei com
síndicos profissionais felizes em ganhar mais de R$ X.XXX,XX por mês,
comparecendo apenas duas vezes por semana no condomínio, durante uma hora,
'empurrando com a barriga', enquanto outros são chatos ao extremo (no bom
sentido), combinam um valor justo e fazem com que cada centavo investido seja
considerado bem empregado.
Por isso que se deve tentar resguardar de alguns cuidados
mínimos para contratar um síndico profissional, facilitando eventual
necessidade de desligamento quando ele não atende as expectativas criadas.
Aliás, não se pode lidar com 'expectativas' nesse caso. É preciso colocar tudo
no papel e exigir seu cumprimento, como veremos a seguir.
Da Eleição do Síndico Profissional
Comecemos pela eleição
do síndico profissional, pois a possibilidade de contratação do síndico não
condômino está prevista no Código Civil, que estabelece:
Art. 1.347. "A assembleia escolherá um
síndico, que poderá não ser condômino, para administrar o condomínio,
por prazo não superior a dois anos, o qual poderá renovar-se." - sem
grifos no original.
Também a Lei n.º 4.591, de 16 de dezembro de 1964, que
não foi revogada, estabelece em seu artigo 22 que:
§4º "Ao síndico, que poderá ser
condômino ou pessoa física ou jurídica estranha ao condomínio, será
fixada a remuneração pela mesma assembleia que o eleger, salvo se a Convenção
dispuser diferentemente." - sem grifos no original.
Todavia, se eventualmente alguma Convenção de Condomínio
proibir essa possibilidade, entendo que vale o que está escrito no Código
Civil, pois não podem as normas internas do condomínio contrariar lei federal
quando essas possuem Capítulos específicos sobre determinado assunto,
especialmente quando permitem a contratação de um síndico não condômino -
evidente que, não obstante meu entendimento, poderão haver decisões judiciais
em contrário.
Além disso, importante esclarecer que o trecho final do
§4º acima refere-se à remuneração do síndico, não conflitando, portanto, com o
Código Civil, estando ambas as normas em pleno vigor.
Mas se a Convenção de Condomínio prevê o prazo de um ano
de mandato do síndico, ela não será considerada irregular, pois o prazo não
pode ser superior a dois anos, mas pode ser, desta forma, inferior - e isso já
seria uma forma de fazer uma espécie de recall
do síndico profissional, pois permitiria sua reeleição, a escolha de um novo
síndico profissional ou mesmo de um síndico condômino.
Da Destituição do Síndico
É bom esclarecer desde logo que as normas previstas nas
duas leis acima sobre a destituição do síndico condômino, aplicam-se também ao
síndico profissional. Assim, temos no Código Civil que:
Art. 1.348. (...)
§2o "O síndico
pode transferir a outrem, total ou parcialmente, os poderes de representação ou
as funções administrativas, mediante aprovação da assembleia, salvo disposição
em contrário da convenção."
Art. 1.349. "A
assembleia, especialmente convocada para o fim estabelecido no §2o do
artigo antecedente, poderá, pelo voto da maioria absoluta de seus
membros, destituir o síndico que praticar irregularidades, não prestar contas,
ou não administrar convenientemente o condomínio."
Art. 1.350. "Convocará o síndico,
anualmente, reunião da assembleia dos condôminos, na forma prevista na
convenção, a fim de aprovar o orçamento das despesas, as contribuições dos
condôminos e a prestação de contas, e eventualmente eleger-lhe o substituto e
alterar o regimento interno."
Art. 1.355. "Assembleias extraordinárias
poderão ser convocadas pelo síndico ou por um quarto dos condôminos."
E a já mencionada Lei n.º 4.591/64 estabelece em seu
artigo 22, que:
§5º "O síndico poderá ser destituído,
pela forma e sob as condições previstas na Convenção, ou, no silêncio desta
pelo voto de dois terços dos condôminos, presentes, em assembleia-geral
especialmente convocada.
Nesse caso, todavia, vale o que está no artigo 1.349, do
Código Civil, que prevê a maioria absoluta, e não os dois terços, embora haja
entendimentos de que se a Convenção é antiga, e prevê 2/3, eles prevalecem
sobre o atual Código Civil:
1006327-13.2015.8.26.0100
|
|
Classe/Assunto: Apelação
/ Assembléia
|
|
Relator(a): Maria
Cristina de Almeida Bacarim
|
|
Comarca: São Paulo
|
|
Órgão julgador: 29ª
Câmara de Direito Privado
|
|
Data do julgamento: 28/06/2018
|
|
Data de publicação: 28/06/2018
|
|
Data de registro: 28/06/2018
|
|
Ementa: "Apelação.
Ação Declaratória de Nulidade de Assembleia Condominial. Condomínio Edilício - Assembleia
Geral Extraordinária convocada com a finalidade de destituição do síndico - Alegação de
insuficiência de quórum e cerceamento de defesa - Sentença de improcedência -
Apelo do autor - Convenção de Condomínio anterior ao Código Civil
de 2002 estabelecendo quórum de 2/3 - Prevalência da Convenção sobre o Código
Civil - Quórum insuficiente - Sentença reformada. Apelo provido."
|
De qualquer forma, como se percebe, valem também para o
síndico profissional as normas que já existem para o síndico condômino.
Do Contrato de Prestação de Serviços com o Síndico Profissional
É importante o condomínio criar outros mecanismos para se
defender quando o síndico profissional não corresponde às expectativas que nele
foram depositadas e isso se percebe logo no início da gestão.
Embora aqui entremos naquele cenário nebuloso, onde a lei
não é tão clara, e que tudo o que escrevo fica sujeito ao crivo do Poder Judiciário,
alguns cuidados mínimos mostram ao juiz a boa fé com que foi celebrado o
contrato e minimizam as chances do condomínio ser prejudicado.
Portanto, para tentar evitar um desastre maior, sabe-se
lá de quais proporções, sugiro:
a) Já discutir, aprovar e fazer constar na própria Ata de
Assembleia que eleger o síndico profissional o valor da remuneração e as
possibilidades de imediata rescisão contratual, permitindo, por exemplo, para
facilitar para o condomínio, que no mínimo dois conselheiros (ou o subsíndico e
um conselheiro) possam convocar a assembleia para destituição do profissional.
Assim, lá na frente, numa outra assembleia, que seria a
de destituição, os moradores explicariam os motivos que entendem demandar a
rescisão do contrato e concederiam a oportunidade do síndico profissional nela
se defender, para continuar ou não no cargo.
Uma assembleia desse tipo, portanto, teria no seu Edital
de Convocação, no mínimo, a seguinte pauta:
1) Esclarecimentos, defesa, deliberação e votação para a
destituição ou não do síndico profissional;
2) Eleição de síndico condômino para cumprimento do
restante do mandato até __/__/____. (ou da próxima assembleia de eleição do
próximo síndico profissional em __/__/____); ou votação e eleição de novo
síndico profissional imediatamente (também para cumprimento do término do
mandato). - esse item fica prejudicado se os moradores não quiserem que o
profissional deixe o cargo.
Observação: É importante que já a primeira assembleia que eleger o
síndico profissional contenha o nome dos candidatos entrevistados pelos
moradores (preferencialmente com seu consentimento), consignando em ata, pois
isso permitirá que os três primeiros votados fiquem numa espécie de lista de
espera, já com aprovação dos moradores e
anuência dos candidatos, sendo que caso os moradores façam uma experiência e
não gostem do primeiro profissional, possam nessa assembleia de destituição já
escolher o segundo, que poderia ficar de prontidão, sabendo, todavia, do risco
do outro síndico permanecer no cargo após sua defesa.
Essa assembleia também já poderia ter um compromisso do
próprio síndico profissional, em que ele assumiria diante da assembleia algumas
obrigações, sendo que isso faria parte do próprio contrato a ser assinado, como
por exemplo, a possibilidade de rescisão imediata do contrato, a qualquer tempo,
sem aviso prévio e qualquer tipo de multa ou indenização, seguindo o ditado
popular, segundo o qual 'quem não deve, não teme'.
b) O Contrato de Prestação de Serviços poderia ter
algumas cláusulas, dentre aquelas que normalmente advogados(as) inserem num bom
contrato, para defender seus clientes - daí a importância de sempre submeter o
contrato a um(a) advogado(a). Isso pode parecer corporativismo, e de certa
forma é mesmo, mas não dá para entregar a administração de seu patrimônio nas
mãos de alguém sem apoio de quem conhece as normas jurídicas, no caso, o(a)
advogado(a).
A situação é atípica, mas sugiro que a própria assembleia
autorizaria que a assinatura do contrato seria realizada pelos integrantes do
conselho e/ou subsíndico, além do síndico profissional e duas testemunhas, tudo
isso com ciência dessa assembleia que o elegeu.
Sugestões de algumas cláusulas:
Cláusula X – Só poderão ser contratados com anuência e assinatura do(a)
Subsíndico(a) e 1 Conselheiro, após análise a aprovação do escritório que
presta serviços jurídicos ao condomínio, a contratação de prestação de serviços
terceirizados, de reforma e pintura da fachada, além de outros cujos valores
ultrapassem o valor de R$ xxx,xx
(Trata-se de sugestão
para impedir que contratos sejam assinados sem prévia análise jurídica e em
valores elevados, sem consulta de subsíndico e conselheiro.)
Cláusula XX – Os seguintes serviços e normas são aplicados ao presente
contrato e serão prestados pela Contratada ao Contratante: Normas do Código
Civil, da Lei nº 4.594/64 e outras em vigor, Convenção de Condomínio e
Regimento Interno da Contratada, respeitando-se, ainda, o disposto nas Atas das
Assembleias e, especialmente o deliberado na Assembleia Geral
Ordinária/Extraordinária que aprovou a contratação do Contratado, sendo
competências do Síndico também...
(Essa sugestão
permitiria que o condomínio coloque no contrato o que deseja do síndico
profissional, além do que já se espera dele pelas normas que regem o assunto)
Cláusula XXX - A Contratada se responsabiliza pelos danos que possa
eventualmente ocasionar ao Contratante e seus moradores, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violando direito e causando danos,
ainda que exclusivamente moral, nos termos do disposto nos artigos 186 e 927,
do Código Civil.
Cláusula Z - O prazo de duração do presente contrato é de 24 (vinte e
quatro) meses, passando a vigorar a partir de __/__/____, e poderá ser
rescindido pelas partes a qualquer tempo, com ou sem motivação, sem aviso
prévio ou aplicação de multa rescisória.
Cláusula ZZ - As partes convencionam ainda que o presente Contrato exclui a
possibilidade de existência de vínculo empregatício, sendo a Contratada uma
prestadora de serviços que, conforme apresentação pessoal na Assembléia Geral
Extraordinária de __/__/____, também atua ou pode atuar como síndico
profissional em outros condomínios, não havendo exclusividade na prestação de
serviços.
Não há como dizer se um síndico profissional será melhor
ou pior do que um síndico morador. A única certeza é que ao escolher um dos
dois devem os moradores criar mecanismos de controle, de prestação de contas,
exigir informações e transparência da gestão, obrigando que o subsíndico e
conselheiros sejam copiados em todas as mensagens que ele trocar no comando do
condomínio. Em outras palavras, devem os condôminos fiscalizar, fiscalizar e
fiscalizar.
Joel dos Santos Leitão
OAB/SP nº. 173.186
Nenhum comentário:
Postar um comentário